sábado, 29 de setembro de 2012

Um momento antológico no palco de Hebe Camargo



Chico Buarque e a Velha Guarda do Samba

Por Carlos Pinho.

O ano, 1966. Mestres de duas gerações da música popular brasileira reunidos no programa de Hebe Camargo na TV Record. Dentre eles, Dorival Caymmi, Pixinguinha, Donga e Chico Buarque.

Inegavelmente, a história da Hebe, que hoje nos deixou aos 83 anos, confunde-se não só com a da televisão. Ela é um ícone da nossa cultura.

No tempo em que a qualidade de uma programação televisiva tinha um impacto maior numa sociedade com o acesso mais limitado e menos seletivo, Hebe foi uma fomentadora da nossa cultura, sempre buscando levar o que de melhor tínhamos para abrilhantar o seu palco, já tão iluminado pelo seu inconfundível carisma.

Vai deixar saudade.


quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O não entendimento faz parte do plano


 

Quebrando correntes...
O que eu senti fica pra sempre, mesmo que as pessoas por quem eu senti se percam de mim no meio do caminho. Amar, para mim, se conjuga no passado apenas gramaticalmente, na vivência não. Guardo o sentimento, mesmo quando não é mais atual, ainda assim é presente dentro de mim. Faço questão de não jogar fora o carinho que tenho por cada um que passou por mim de uma maneira especial. Faço questão é de alimentar. Não quero esquecer um ex-namorado porque o namoro acabou. Nem quero esquecer alguém com quem partilhei muitos bons momentos só porque não nos relacionamos mais diretamente. Eu, do meu modo, continuo me relacionando com todos, mesmo que indiretamente. Posso não me relacionar mais com diversas pessoas que passaram pela minha vida através da fala, do contato direto, de encontros físicos, mas eu me relaciono através da lembrança, do pensamento, da saudade, do reconhecimento.  Eu me relaciono também através da escrita. Disso aqui que eu escrevo pensando em amigos que por algum motivo se distanciaram, em outros que já se foram pro além-mundo terreno, e outros ainda que tiveram passagem rápida, às vezes só de um dia, mas que por algum motivo me marcaram.
Há lembranças tão saborosas, com gosto de chocolate e aroma de dama-da-noite (aroma de que mais gosto), que faço questão de rechear minha memória com elas diariamente. Não quero esquecer. Nada que foi importante. Nem a dor da perda, a decepção por achar que conhecia e descobrir que não, nem a lágrima do amor sofrido, nem o silêncio sufocante da melancolia depressiva. Nem a gargalhada com sabor de brilho nos olhos eterno, nem o abraço com jeito de porto-seguro acompanhado de pôr-do-sol. Nascer do sol. Nasço novamente todos os dias e em cada nascimento meu surgem novas características, sonhos e planos. Quimeras doces com cheiro de erva doce e delicadas como violetas, corpo de água que nada como sereia dentro de si mesmo. Nascem comigo todos os dias novas expectativas, novas possibilidades capazes de gerar outras mil. Novas capacidades de olhar diferente pro mesmo objeto, de sentir diferente o mesmo cheiro, de se deliciar de modo diferente com a mesma língua.
Mãos que movem móveis em casa, mãos que constroem os móveis da vida, nos quais nos apoiamos para sentar, deitar, comer e amar. Pensamento que move a mente e sentimento que move a alma. Energia que move o corpo e poesia que renova a capacidade de viver. E de viver bem. Nasce comigo a cada madrugada, prontos para serem aproveitados a partir de cada manhã.
Morre comigo a cada noite o que foi concluído. Às vezes não chega ao fim, mas ainda assim é concluído por já ter alcançado o sentimento desejado. O objetivo não é no plano material, mas naquele plano onde os sentimentos brincam de pular corda e de pique-esconde. E também de colorir. Colorem momentos, pessoas e paisagens e são mutuamente coloridos por si mesmos, entre si mesmos e também por aquilo que colorem.
Mas guardo comigo também a morte. O não vivo é também presente em minha alma. Não me esqueço de nada. E não quero esquecer. Morreu. Apagou. Não respira mais. Mas ainda guardo o sentimento ou, pelo menos, a lembrança querida do sentimento.
“Poesia não é para compreender, é para incorporar.” (Manoel de Barros)

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

ELIS REGINA E ANTONY GORMLEY NO CCBB

        Não é preciso falar muito sobre Elis Regina. Nossa querida ‘pimentinha’, dona de uma das mais belas vozes femininas e uma das maiores, se não a maior, intérprete de nosso país, está sendo homenageada na exposição “Viva Elis”, parte integrante do projeto de mesmo nome realizado e patrocinado pela Nívea.
                A exposição se divide em três núcleos sobre a vida e carreira de Elis, incluindo fotografias, documentos escolares e contratuais, biografia, vestidos usados por ela em shows, muitos vídeos e espécies de computadores interativos nos quais se pode ouvir toda a sua discografia. É possível passar uma tarde inteira ouvindo seus discos, deliciando-se e emocionando-se com sua voz divina e arrebatadora.
                Não tão rica em conteúdo e com pequenos defeitos como, por exemplo, a má organização das legendas das fotos, vale à pena conferir a exposição, tanto para conhecer melhor Elis quanto para se enternecer com os timbres de sua voz.

                Já Antony Gormley talvez não seja um nome tão facilmente reconhecível em meio a nós quanto o de Elis, porém sua exposição vale muitíssimo a pena ser conferida e é de igual grandiosidade. Enquanto Elis surpreende com sua música, Antony surpreende com sua criatividade absurda, que choca pela inovação de ideias.
                Muitos já devem ter lido a seu respeito devido às suas famosas estátuas espalhadas pela cidade, em topo de prédios, calçadas e no próprio prédio do CCBB. Usando seu corpo e existência como modelo, essa sua obra “Event Horizon” trabalha o corpo humano e o espaço, transformando os horizontes da cidade. O espaço, por sinal, é perceptivelmente seu tema central e, a partir de seu próprio corpo, Antony une um ao outro em diversas de suas obras. A genial obra “Amazonian Field”, realizada em 1992 em Porto Velho, na qual o artista produziu, em conjunto com 60 pessoas, cerca de 24 mil formas corporais feitas em barro, é uma das mais surpreendentes. Foram 18 toneladas de terra trabalhada com o objetivo de preencher, com essas pequeninas esculturas, um espaço – como uma sala – no qual “cada observador se torna uma interface viva entre o passado e o presente; entre o espírito dos ancestrais e os ainda não nascidos: o tópico involuntário da obra”, como é descrita a obra do artista.


 


                A exposição, realizada pelo Ministério da Cultura e pelo Banco do Brasil, é uma retrospectiva desse artista londrino que já ganhou diversos prêmios e já expôs em importantes mostras, como a Documenta de Kassel e a Bienal de Veneza. Como diz Marcello Dantas no encarte da exposição, “Antony Gormley construiu uma das mais coerentes pesquisas estéticas das últimas décadas da arte contemporânea. Baseando-se na tensão entre o corpo e o espaço, ele criou espaços, redefiniu o vazio e o pleno e endereçou a observação sobre o corpo como um procedimento participativo. Para entender Gormley, é preciso ver com a pele, mensurar com os olhos e se deixar ocupar pelo essencial sentido de presença, ferramenta fundamental para vivenciar sua obra.”
                Aberta até o dia 23 de agosto, a exposição reúne ainda obras da série “Blockwork”, que consiste em uma tentativa de mostrar o corpo como se fosse uma construção, através de blocos de aço; a obra “Floor” é o trabalho mais antigo da exposição, a qual reproduz o contorno dos pés do artista, fazendo “alusão a um campo de energia que torna a zona corporal porosa e aberta”, como diz a legenda da obra; modelos de projetos; a interessantíssima “Mother’s Pride IV”, uma versão nova de uma obra de 1981, realizada a partir de fatias de pães de fôrma secas e mergulhadas em parafina para a sua conservação; a fantástica e interativa “Breathing Room IV”, que funciona como uma mandala tridimensional, cheia de contrastes entre o conforto e o confronto, o meditativo e o interrogativo, a observação e a interação; dentre outras. Confiram!